Na era da internet e das redes sociais, parece existir um fenômeno curioso ocorrendo: mesmo estando mais conectados do que nunca, muitas pessoas sentem uma crescente sensação de isolamento e solidão, o que impacta até mesmo a saúde pública.
Preocupação global com a solidão
Aliás, esse aspecto tem sido alvo de preocupações ao redor do mundo. O The Lancet, um dos mais estimados jornais científicos, anunciou recentemente a formação de um comitê para estudar o tema. Em julho, os editores da publicação enfatizaram o quão prejudicial para a saúde física e mental este fenômeno pode ser.
A solidão está ganhando reconhecimento como uma preocupação social e de saúde pública. Por isso, países como o Japão e o Reino Unido nomearam “ministros da solidão” para tratar do assunto. Nos EUA, por exemplo, a autoridade máxima em saúde pública do país comparou o impacto da solidão ao do tabagismo, destacando sua associação com várias condições de saúde física e mental.
“A nossa epidemia de solidão e isolamento tem sido uma crise de saúde pública subestimada que tem prejudicado a saúde individual e social. Nossos relacionamentos são uma fonte de cura e bem-estar escondidos à vista de todos – algo que pode nos ajudar a viver vidas mais saudáveis, plenas e produtivas”, disse Vivek Murthy.
Riscos das redes sociais e das comparações
Na medida em que a tecnologia avança, paradoxalmente, nos encontramos em um labirinto de isolamento, afirma Anne Crunfli, psicóloga especialista em Terapia Cognitivo Comportamental. Segundo ela, a constante exposição a vidas aparentemente ideais nos empurra para um ciclo de comparações e insatisfação, destacando a discrepância entre o real e o virtual.
“As pessoas, em sua maioria, não sabem o que querem, se vêem sem identidade, perdidas em tantas possibilidades de exercer a sua posição no mundo. O indivíduo está só na sua construção, na sua individualidade e em suas possibilidades. É um ser só e único no mundo”, complementa a psicóloga.
Além disso, a profissional destaca que as redes sociais não servem apenas como um interlocutor para termos acesso reciprocamente, mas também como um veículo para a projeção de um eu idealizado. “Isso pode levar a uma sensação de desconexão entre o eu real e o eu projetado, contribuindo para a solidão”, complementa.
Segundo Crunfli, é importante fazer o “resgate do eu interiorizado” como uma forma de contraponto ao modelo social imposto. “Essa busca por uma identidade mais autêntica e profunda pode oferecer uma saída para o indivíduo que se sente perdido na busca por um eu idealizado nas redes sociais”, enfatiza a especialista.
Encarando o problema de frente
Diante desse cenário é importante avaliar as interações sociais e como se dá o relacionamento com a tecnologia, ressalta Anne. Inclusive, encontrar um equilíbrio saudável entre a conectividade digital e a conexão genuína com os outros e consigo pode, em um primeiro momento, ser uma tarefa difícil. No entanto, é uma batalha importante se de lutar, destaca a psicóloga.
Para enfrentar a solidão nesta era digital, é crucial unir três ideias, de acordo com a especialista:
- Fortalecer nossos laços com a comunidade;
- Ser seletivo com o que vemos nas redes sociais;
- Refletir sobre nossas próprias escolhas e identidade.
Isso significa construir relações reais, escolher conteúdos que nos façam bem e pensar por nós mesmos, fora das pressões sociais. Para Crunfli, a combinação pode nos ajudar a nos sentir mais conectados e satisfeitos com nossas vidas.
Ela também oferece dicas práticas de como fazer um uso consciente das redes sociais e afastar os males da solidão. Confira:
- Limite o tempo de uso, fazendo uso positivo das redes. Além disso, preste atenção ao que está consumindo e lembre-se que o conteúdo importa. Portanto, faça uma “limpeza” nos perfis, canais que você segue, busque conteúdos que agreguem algo para você e que não o faça entrar em uma roda comparativa desmotivadora;
- Para os pais ou cuidadores, é importante monitorar as crianças, todos os aplicativos hoje, ou sistemas operacionais estão permitindo o controle parental;
- Verifique se o conteúdo está adequado para a idade e, acima de tudo, converse para entender o que seu filho (a) consome ou como faz uso das redes sociais. Como as crianças estão em processo de desenvolvimento, estimule a conversa e o aprendizado.